A grande importância das embalagens na proteção, movimentação, identificação e exposição é aceita por todos sem restrição que trabalham com alimentos industrializados.
É estranho que a mesma percepção não se estenda aos agentes de produção e de comercialização de frutas e hortaliças frescas, alimentos com alto teor de água, metabolismo intenso na pós-colheita, muito sensíveis a danos mecânicos e muito perecíveis.
A produção de frutas e hortaliças frescas valorizadas – alto frescor, saborosa, bom tamanho, ausência de defeitos, aparência atraente – exige grande competência do produtor, boa aptidão climática da região de plantio e parceria com ‘São Pedro’. A qualidade é construída na produção e só pode ser conservada na pós-colheita, nunca melhorada.
A conservação da qualidade exige a prevenção dos danos físicos, que aceleram a senescência, diminuem o valor do produto e podem permitir entrada e o desenvolvimento de microorganismos oportunistas, levando ao apodrecimento do produto.
Podemos dividir as embalagens utilizadas no mercado atacadista de frutas e hortaliças frescas do Entreposto Terminal de São Paulo em granel, reutilizável, descartável e retornável.
1. Granel
O produto não é embalado. Ele é empilhado na carroceria do caminhão, o que exige grande habilidade, mas causa grandes danos ao produto. O sistema é muito utilizado para mamão Formosa, melancia, abacaxi, coco, jaca e até para melão, abacate e manga. Ele pode ser vendido a granel como acontece com a melancia, o coco, a jaca e uma parte do abacaxi. A maioria das cargas a granel de abacaxi, o melão, o abacate e manga é embalados depois de chegar ao mercado ou próximo dele antes da venda ao varejo.
2. Reutilizável
As caixas de madeira e de papelão são, em teoria, caixas descartáveis, para serem utilizadas uma única vez e encaminhadas para reciclagem. Na prática as duas acabam sendo reutilizadas. As caixas de papelão de melhor qualidade acabam sendo reconduzidas para reutilização. A utilização das tradicionais caixas de madeira, caixa K e engradado, são servidas por um serviço logístico muito eficiente que garante comodidade e praticidade na compra e no carregamento. Não é preciso programar a aquisição das caixas. Elas estão prontas para retirada no caixeiro. A recompra da caixa usada premia o varejista que retorna a caixa e permite a manutenção do sistema. A medida que a caixa vai sendo utilizada ela perde valor e muda de produto. O produtor de tomate adquire caixa nova, de primeira viagem. Na segunda a mesma caixa poderá ser adquirida por um produtor de pimentão e depois por um produtor de berinjela e por último por um produtor de mandioca. Depois da mandioca a caixa vira problema da Prefeitura. O sistema dos ‘Caixeiros’ sobrevive até hoje pela sua eficiência no atendimento aos clientes e está completamente fora da lei e do atendimento às exigências da segurança alimentar. As embalagens são ásperas, machucam os produtos, são feitas e não cumprem as suas funções de proteção, movimentação, identificação e exposição. Elas não obedecem às exigências legais e os locais de fabricação, manuseio e armazenagem das caixas são vergonhosos. A exigência do cumprimento das leis vigentes é a solução.
3. Descartável
Nos últimos anos houve grandes e promissoras mudanças. Surgiram fabricantes de caixas de madeira laminada e a sua utilização está crescendo.
O preço da madeira subiu, o que tornou o preço de uma caixa K semelhante ao preço de uma boa caixa de papelão, com a mesma capacidade.
Algumas das grandes empresas de papelão criaram um sistema de montagem e venda de caixas prontas. São oferecidas algumas medidas de caixas. O primeiro empreendimento foi o ‘Caixa Pronta’ da RIGESA, localizado próximo ao Entreposto Terminal de São Paulo da CEAGESP. Comprar e utilizar caixa de papelão é mais fácil que caixa de madeira reutilizável, com outra grande vantagem como a obediência às exigências legais.
A ABPO – Associação Brasileira de Papelão Ondulado desenvolveu uma família de embalagens modulares, que permitem o empilhamento e a paletização de embalagens de diferentes capacidades.
A grande maioria das embalagens é de medidas paletizáveis, submúltiplas de 1,0m por 1,20 m. Uma parte das mudanças se deve ao envolvimento das empresas fabricantes de papelão.
4. Retornável
Existem dois tipos de embalagem retornável, aqui caracterizada como a embalagem que retorna ao dono: madeira e plástico.
As embalagens de madeira retornáveis são conhecidas também como caixas proprietárias. Elas são utilizadas pelos atacadistas e produtores de citros e banana, principalmente. A caixa é robusta e muito pesada (em torno de 6 kg), o que encarece a sua movimentação. Ela apresenta para o usuário um problema grave – a administração do retorno, da conservação e da manutenção de um estoque. Elas não conseguem obedecer á lei que exige a higienização da caixa retornável a cada uso. Não existe um processo de higienização aprovada para caixas de madeira.
A caixa plástica é utilizada em muitos países em circuito fechado. O produtor, quando embala o produto, sabe o seu destino e sabe que pode retirar ou receber uma caixa vazia na medida da sua necessidade. Hoje os produtores e atacadistas que entregam frutas e hortaliças nas centrais de distribuição das grandes redes de supermercados, já retiram a caixa vazia higienizada após a entrega – um circuito fechado.
A maior parte da comercialização é feita em circuito aberto. No embalamento do produto o produtor não sabe qual será o destino do seu produto. Os problemas de gerenciamento da caixa plástica são maiores até que os da caixa de madeira retornável: alto custo, higienização, controle do retorno, sumiço de caixas.
Uma proposta nova de gerenciamento de caixas retornáveis foi construída pela equipe técnica da CEAGESP. Ela foi adotada com algumas modificações nas Ceasas de Uberlândia, Porto Alegre, Recife e Contagem-MG.
As bases da proposta são:
1ª) Todos os usuários pagam pela caixa, através da compra de um crédito-caixa. Se o usuário perder a caixa ele já pagou por ela e terá que comprar um novo crédito-caixa.
2ª) A administração do retorno da caixa, da sua higienização, do estoque, do recebimento e da entrega da caixa vazia são responsabilidades de uma empresa especializada. O usuário deixa de se preocupar com sumiço de caixa, higienização, controle de caixa, manutenção de estoque.
3ª) Não deve ser permitida a entrada de caixa vazia dentro do mercado atacadista. Ela deve ser entregue ou retirada no ‘Centro Logístico de Caixas’.
4ª) A caixa não tem marca. Ela poderá ser fabricada por diferentes fabricantes desde que obedeça às exigências de tamanho, encaixe e de qualidade estabelecidas.
A situação atual das embalagens de frutas e hortaliças frescas é preocupante:
1º) A maioria das embalagens não cumpre suas funções de proteção, facilidade de movimentação, identificação e exposição.
2º) Existe grande reutilização das caixas de madeira, de papelão e de sacarias, que deveriam ser recicladas após cada uso.
3º) A utilização de caixas retornáveis plásticas sem higienização é muito comum.
4º) A administração das caixas retornáveis num circuito aberto é muito difícil e gera grandes perdas.
5º) As exigências legais são maiores a cada dia.
6º) As exigências dos compradores crescem todos os dias7. Grande dificuldade de unitização de carga.
7º) O custo da carga e descarga no mercado atacadista é alto. Hoje o custo por caixa da descarga paletizada semelhante à não paletizada.
8º) A adoção da unitização de carga é pequena exige embalagens paletizáveis e modulares, barracões de classificação e consolidação de carga nas regiões de produção, carga e descarga paletizada na produção, no atacado e no varejo (doca, equipamentos), unidades menores de unitização (mini paletes) e a a adequação do veículo de carga. .
9º) A embalagem não chega à gôndola do varejo. Todos os esforços na produção podem ser destruídos facilmente se o produto for retirado da caixa e despejado na gôndola do varejo.
10º) Concorrência desleal. Muitas leis só existem no papel. Não existe punição para quem desobedece as exigências legais ou as regras de boas práticas. Não existe premiação para quem se esforça para melhorar a embalagem, o transporte, o armazenamento e a movimentação do seu produto. O comércio de reutilização de embalagens inadequadas, não higienizáveis, não retornáveis não sofre restrições. As embalagens retornáveis são reutilizadas sem higienização.
O levantamento realizado pela CEAGESP desde 2004 é um bom retrato da evolução das embalagens de frutas e hortaliças e pode ser extrapolado para o Brasil. A cada ano são entrevistados os atacadistas mais representativos e estimada uma % da utilização de cada tipo de embalagem para cada produto. Os dados de volume por produto são do SIEM – Sistema de Informação e Estatística de Mercado da CEAGESP, baseados nas informação de entrada – cada veículo que entra com produto deixa uma via da nota fiscal na portaria da CEAGESP. Os volumes impressionam. Em 2009 foram comercializados 6.607 mil toneladas de frutas e 5.553 mil toneladas de hortaliças. No grupo das hortaliças os legumes foram responsáveis por 58% do volume, diversos por 25% e verduras por 17%.
Aqui está a evolução entre 2004 e 2009 por tipo de embalagem: madeira, papelão, plástico e sacaria:
– Queda na participação da madeira de 56 para 41% e da sacaria de 8 para 7% e um crescimento na participação do papelão de 35 para 44% e do plástico de 1% para 8 %, no número total de embalagens de frutas e hortaliças frescas (Figura 01).
– A madeira ainda predomina nas frutas, mas a sua participação diminuiu de 50% em 2004 para 39% em 2009. A predominância da madeira se deve ao grande volume de laranja e de banana, que utilizam principalmente a madeira (Figura 02 e Figura 03).
– A madeira ainda domina os legumes, mas a sua participação caiu de 80% em 2004 para 46% em 2009. Uma grande mudança para caixa de papelão e de plástico está sendo observada nas embalagens de tomate, o produto de maior volume dos legumes (Figuras 02 e 03).
– A utilização da embalagem de madeira nas verduras também caiu de 84% para 74% e chegou a 4% nos diversos em 2009, em função da embalagem de madeira do alho (Figuras 02 e 03).
– As embalagens de papelão entre 2004 e 2009 cresceram nas frutas (de 50 para 54%), nos legumes (de 18 para 41%) e nos diversos (de 19 para 18%) (Figuras 02 e 03).
– As embalagens de plástico apresentaram um grande crescimento, apesar de continuarem com uma pequena porcentagem do total do número de embalagens. Elas cresceram , entre 2004 e 2009, nas frutas de menos de 1% para 8%, nos legumes de 2 para 9% e nas verduras foi de menos 1% para 14% (Figuras 02 e 03).
Elas devem ser implementadas em cada ponto: da produção ao consumo. Aqui estão algumas das medidas que devem ser adotadas:
No varejo: Campanha de adoção do Manuseio Mínimo, treinamento dos gerentes e funcionários do setor de FLV, financiamento para a melhoria da infra estrutura de transporte, recebimento, armazenamento, codificação e exposição, exigência de obediência à lei de rotulagem, embalagem, proteção.
No transporte: Treinamento dos motoristas e transportadores; financiamento da adequação do seu veículo às exigências da lei; exigência de obediência à lei de transporte de alimentos
No atacado: Implantação do Centro Logístico de Caixas responsável pela administração do retorno e da higienização das caixas vazias retornáveis e pelo recolhimento e encaminhamento para a reciclagem das embalagens descartáveis, exigência de obediência à lei da rotulagem e adoção de um código comercial e arbitragem independente, que garanta maior transparência, menor fragilidade comercial e preços mais justos.
Na produção: Financiamento para a melhoria da infra estrutura de colheita, classificação, embalamento, armazenamento e transporte; capacitação dos produtores, seus funcionários, seus transportadores;incentivo à criação de barracões de classificação geridos por grupos de produtores ou terceiros; cadastro municipal dos transportadores e dos agentes de comercialização locais.
A implantação de uma política de mudanças gradativas impedirá que os pequenos,na produção, no atacado, no varejo e no serviço de alimentação, sejam atropelados pelas mudança que acontecerão e nos atrapelarão, independentes da nossa vontade e preparação.
*Texto escrito pelos colaboradores: Anita de Souza Dias Gutierrez, Cláudio Inforzato Fanale e Hélio Satoshi Watanabe.
Fonte: CEAGESP – Centro de Qualidade em Horticultura