DECIO ZYLBERSZTAJN*
Os custos de produção na agricultura têm sido um tema debatido à exaustão que ganhou nova importância como resultado de medidas regulatórias incidentes sobre o produtor agrícola.
Produtores adquirem insumos de um pequeno número de empresas que operam em escala global. Vendem a produção por meio de um conjunto de empresas concentradas que, em muitos casos, são as mesmas que fornecem os insumos. Os mercados dos produtos e insumos agrícolas são interligados e apresentam graus de concentração diferentes, com efeito sobre os preços. A agricultura é segmentada, enquanto a indústria de insumos é concentrada. Em tal condição, a agricultura recebe rapidamente os impactos de alta dos preços dos insumos e demora a sentir os efeitos do desaquecimento que se refletem na queda nos preços dos fatores de produção. Lidar com essa assimetria exige preparo das entidades de representação do setor agrícola.
A agenda que decorre do debate socioambiental ganhou espaço nas sociedades modernas. A tendência é de restrição no uso de fatores na agricultura – sejam os tradicionais, como terra e trabalho, sejam os insumos que caracterizam a tecnologia de produção com base biotecnológica e agroquímica.
Os consumidores passaram a exigir informações sobre a estrutura de produção, gerando a necessidade de mecanismos de certificação. Alguns setores evoluíram exemplarmente, como atesta o caso da produção de madeira certificada. Neste caso o mercado exige e paga pela certificação. Outros setores seguem o mesmo caminho. O produtor altera as tecnologias e práticas organizacionais com efeitos sobre os custos de produção. Ao fazê-lo, espera receber o benefício que recompense os custos incidentes.
O governo também adota medidas regulatórias com a intenção de salvaguardar a sociedade. Elas definem os insumos e as práticas agrícolas a serem banidas, medidas de proteção ao trabalhador rural, áreas a serem mantidas como reserva permanente, etc.
Os custos que sempre existiram incidiam na sociedade na forma de poluição, depreciação da capacidade dos solos, exaustão dos recursos hídricos, condições de trabalho aviltantes e risco para a saúde gerado por resíduos nos produtos alimentares. As medidas apontadas realocam a incidência dos custos para o agricultor.
A organização da agricultura para lidar com a rentabilidade ganhou nova roupagem. O desenvolvimento e a comercialização da tecnologia impõem controles de custos, para os quais os agricultores não estão bem preparados.
Como o agricultor, individualmente, tem pequena capacidade de negociação, são as suas entidades de representação que se podem aparelhar para a negociação com o setor de insumos com base em mecanismos contratuais.
O tema regulatório socioambiental é de mais difícil trato. A sua implantação estabelece restrições para os produtores. Qual o impacto das restrições nos custos incidentes nos sistemas agroindustriais? Qual o perfil dos consumidores dispostos a pagar por atributos associados ao equilíbrio socioambiental? Como informá-los a respeito de atributos nem sempre visíveis nos produtos finais? Qual o papel das redes de distribuição de alimentos?
Tais questões nos permitem elaborar duas conclusões. Primeiro, o aperfeiçoamento dos mecanismos privados de certificação serão necessários para levar a informação aos consumidores. Segundo, as entidades de representação dos agricultores deveriam estudar o fenômeno da adaptação da agricultura e da pecuária à configuração dos mercados mais exigentes.
Os agricultores, do empresário familiar ao produtor de grande porte, deverão adequar-se à agenda que reconfigura a agricultura mundial. Aos centros de pesquisa e às entidades setoriais cabe o esforço para a geração de conhecimento sobre a operação dos Sistemas Agroalimentares e o efeito das restrições.
*ENGENHEIRO AGRÔNOMO, PROFESSOR TITULAR DA FEA-USP, PRESIDENTE DO CONSELHO DO PENSA (CENTRO DE CONHECIMENTO EM AGRONEGÓCIOS), É MEMBRO DO CONSELHO DE AGRICULTURA DA FIESP
Fonte: Jornal O Estado de S. Paulo