Queda de preços de orgânicos acirra concorrência no mercado ‘fit’

O pão tem sementes de abóbora, linhaça e girassol. O bolinho de bacalhau é assado e feito com batata baroa. A banana da terra vem com pasta de amendoim integral. O setor de alimentação saudável vem enfrentando os reflexos de uma concorrência cada vez mais “natural,” que vai além do já popular suco detox: embalado pelo aumento no número de fornecedores, os preços dos chamados produtos orgânicos (sem agrotóxicos e fertilizantes) caíram no último ano, especialmente para quem compra em maior quantidade. A mudança tem ajudado o setor a passar ao largo da crise econômica.

Segundo a Organic Brasil, que reúne os produtores, a tendência é de expansão. No ano passado, a produção aumentou 20%, com faturamento estimado de R$ 3 bilhões. Para este ano, a meta é avançar entre 25% e 30%. O Brasil já exporta. Em 2016, foram US$ 145 milhões com a venda para outros países, número que deve crescer 10% neste ano.

— A produção vem aumentando. A crise também tem levado o setor a fazer promoções. Dependendo da época e do produto, o preço do orgânico já é igual ao do convencional. Mas, no geral, o preço do orgânico ainda é mais caro — disse Ming Liu, diretor do Conselho Nacional da Produção Orgânica e Sustentável e da Organics Brasil.

REDE INVESTE EM PRODUÇÃO PRÓPRIA

Atualmente, 68% dos brasileiros buscam comidas com alto valor nutricional, patamar acima da média global, de 60%, aponta pesquisa da Kantar. De olho nesse potencial, até redes de fast-food, padarias, shopping centers, hotéis e buffet infantil vêm pegando carona na popularidade da quinoa e da chia.

No Jardim Botânico, o Empório Jardim, restaurante com padaria e delicatessen, decidiu investir em farinha orgânica na fabricação dos pães, que ainda levam variadas sementes. No almoço, a massa da quiche passou a ser sem glúten; e o cuscuz, de quinoa. Com a ajuda do cardápio, a casa abriu sua segunda unidade no ano passado e agora tem novos planos de expansão, lista que inclui até shopping center.

Iona Rothstein, uma das sócias do local, lembra que um dos motivos para o crescimento da empresa foi a estratégia de buscar preços competitivos nos pratos naturais. Ela destaca, porém, que a solução foi ainda abrir mão de parte da margem de lucro para atrair mais consumidores.

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— Não queremos ser uma butique de alimento saudável. Queremos atrair mais consumidores. A alimentação saudável não é mais artigo de luxo. Buscamos preços semelhantes aos de outros restaurantes, com pratos variando entre R$ 36 e R$ 39,90. Somente neste início de ano, nossa produção de pães aumentou 15%. Estamos definindo nossos planos de crescimento. Há interesse de shoppings, que também querem esse apelo natural — explica Iona.

É nos shopping centers que algumas redes de hambúrgueres vêm buscando uma cara nova no varejo. É o caso da Madero, que tem 85 restaurantes no Brasil, dos quais dois no Rio. Junior Durski, fundador e chef da rede, diz que, a partir de outubro, a rede só vai utilizar produtos orgânicos no menu. Ele destaca que a iniciativa só foi possível após verificar uma forte queda no preço dos orgânicos. Pelas suas contas, o recuo foi significativo nos últimos dois anos.

— Há dois anos, os orgânicos eram até cinco vezes mais caros que os não orgânicos. Agora, essa diferença chega a 90%. Estamos ainda investindo em uma fazenda para plantar e colher esses produtos. Essa mudança segue a busca por uma alimentação saudável. Por isso, lançamos recentemente um menu fit, com hambúrguer de carne de quinoa, aveia e cenoura. O molho de maionese, por exemplo, foi substituído por palmito. Esse tipo de menu já responde por 9% das vendas e está crescendo.

CARDÁPIO DA BELA GIL PARA HÓSPEDES

Entre os hotéis, a estratégia é semelhante. A rede Best Western decidiu investir em um cardápio completamente saudável em dois de seus hotéis no Rio de Janeiro. Para isso, convidou a apresentadora Bela Gil para assinar o menu dos restaurantes, oferecendo pratos como salada de painço, nhoque com bertalha e picadinho de carne no caldo de tucupi. Marcio Lacerda, diretor do grupo hoteleiro, destacou que a estratégia foi oferecer aos clientes uma opção diferente na hora da refeição:

— Antes os produtos orgânicos tinham um baixo consumo e um alto custo de produção. Mas o número de fornecedores cresceu, como o de produtores de queijo orgânico, que dobrou. Entre o primeiro cardápio, que lançamos em julho do ano passado, e o segundo menu, em janeiro deste ano, os preços dos itens orgânicos caíram 30%.

Luiz Varejão, sócio do Mironga, no Centro do Rio, também nota a mudança nos preços dos produtos orgânicos. O empresário, que também tem planos de expansão, diz que metade de suas vendas hoje são de grelhados, como os frangos sem antibióticos.

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— A crise é uma oportunidade. As pessoas estão valorizando mais o seu dinheiro, e estão buscando opções melhores para gastá-lo. E a alimentação saudável atende a essa expectativa — destacou Varejão.

Empreendedores também aderiram à tendência. Em março do ano passado, Daniela Almeida decidiu criar uma empresa de buffet para eventos, batizada de Buffet Das Danis. No cardápio, ganharam destaque itens como coxinha de batata doce com requeijão de muçarela de búfala e canapé de berinjela. A demanda foi tão grande que em seis meses ela passou de microempreendedor individual para Simples.

— Tenho cardápio saudável, orgânico e vegano. A demanda está crescendo. Saúde é uma preocupação de todos. Na comida orgânica, não há mais esse mito de que é caro. Os preços caíram 40% no último ano.

 

Fonte: O Globo