O que não vai para o lixo cabe no prato

Enquanto milhares de brasileiros fariam qualquer coisa por um mero prato de sopa, os supermercados jogam fora, anualmente, 13 milhões de toneladas de alimentos, o que representa uma perda de R$ 12 bilhões. Se sozinhos esses números são preocupantes, chamam mais a atenção quando unidos à pesquisa divulgada pelo IBGE há pouco mais de uma semana, que mostrou que a insegurança alimentar, ou seja, a falta de acesso adequado à alimentação, é um problema que ainda atinge 30% da população do país e a situação do Pará está entre as piores, ficando atrás apenas do Maranhão e do Ceará.

Segundo o IBGE, em 11,8% dos lares paraenses as famílias chegaram a passar fome e 10,9% deles não tiveram condições de garantir todos os itens em quantidade necessária à família. Ajudar a mudar essa situação pode estar no compromisso de cada um com o reaproveitamento de alimentos que seriam jogados fora.

Dono de uma rede de supermercados, o empresário José Oliveira assumiu sua parte nessa missão. Há mais de 8 anos ele faz doações semanais para instituições de caridade. Também realiza campanhas internas entre os seus funcionários contra o desperdício. “Fazemos doação de verduras e legumes, como cenoura, batata e repolho. Biscoitos e iogurtes, quando estão próximo do vencimento, também são doados, pois sabemos que o rápido consumo é garantido”.

Uma das instituições beneficiadas pelas doações é a Casa do Menino Jesus III, que abriga crianças do interior e também de outros estados, que vem a Belém para tratamento de câncer, doenças renais e cardíacas. A coordenadora da casa, Irmã Silvanira Barbosa, afirma que, desde quando foi criada, em 1999, a Casa do Menino Jesus sobrevive de doações. “Aqui nós procuramos não desperdiçar nada. Nossa cozinheira costuma fazer bastante comida, e, quando sobra, esta é aproveitada de maneira correta para uma refeição próxima”, diz a irmã, que evoca uma história bíblica para falar sobre a importância das doações. “Quero ser sempre agradecida como o ex-leproso. Busco conscientizar a todos que quem nos doou, tirou um pouco do resultado do seu suor diário para fazê-lo. Quero que comam à vontade, e repitam, mas não deixem nada”, brinca a irmã.

Alimento, do talo à casca

Apesar do grande esforço para evitar o desperdício, a Casa do Menino Jesus nunca passou pela orientação de um profissional para aprender a aproveitar também o que seria classificado, por muitos, como “restos” de alimentos, mas que podem ajudar a enriquecer a dieta nutricional das famílias com baixo custo. A Irmã Silvanira se apressa em querer aprender. “Somos sempre abertos a orientações, dicas sobre como aproveitar tudo e não estragar nada”.

Sementes, folhas, talos e cascas – há maneiras de aproveitar todos eles para dar uma força a mais à alimentação. A casca da tangerina, por exemplo, tem alto teor de cálcio e pode ser usada para fazer patês, sucos e bolos. É o que explica a nutricionista Ana Carla Silva, da Ceasa, onde ela e outros profissionais ministram sistematicamente cursos de aproveitamento integral dos alimentos. “Através do reaproveitamento de muitos alimentos que, geralmente, costumam ser jogados fora, é possível adicionar mais nutrientes no que comemos e tirar o mito de que quem come esses alimentos reutilizados são pessoas pobres”.

Há vários outros exemplos. A abóbora, pode ser aproveitada até a casca – rica em vitamina A, que ajuda a combater a cegueira noturna, e que pode ser usada para mingaus, saladas e doces – e a semente. “Ela é rica em ferro, um dos elementos principais para evitar a anemia. Lavando bem as sementes, adicionando um pouco de sal e assando-as no forno, elas ficam crocantes, como pipoca”.

Outra dica de Ana Carla é adicionar as sementes batidas com o suco de frutas. “O organismo das crianças precisa de 10 miligramas de ferro, e a cada 10 gramas de sementes de abóbora, temos 9,17 mg do mineral”.

Já os talos de qualquer tipo de hortaliça, explica a nutricionista, são ricos em vitamina C e ácido fólico, importantes na produção de glóbulos vermelhos, e fibras, que atuam na regularização da função intestinal e na redução do colesterol. “Os talos podem ser adicionados no arroz, cortados em tirinhas, fazendo um prato colorido e saudável”, ensina.

Fonte: Diário do Pará