Por Paulo César Tavares de Melo*
Tecnologias emergentes despontam no cenário hortícola mundial como ferramentas capazes de alterar os elos da cadeia produtiva e permitem transpor o desafio de produzir mais com menos recursos disponíveis
A despeito dos avanços tecnológicos ocorridos na horticultura brasileira na última década, constata-se o debate sobre tecnologias emergentes já em curso nos países desenvolvidos. São tecnologias que, no prazo de cinco a dez anos, irão substancialmente alterar todos os elos da cadeia produtiva hortícola. Basta ser leitor de revistas especializadas em horticultura de países como Espanha, Estados Unidos, Canadá, Austrália e Japão, para se ter idéia do que há de concreto sobre os avanços tecnológicos prometidos para o futuro próximo pelas empresas especializadas e instituições governamentais de pesquisa, desenvolvimento e inovação desses países.
O número mais recente da revista Horticultura Global, disponível online no portal www.horticom.com/revistasonline, da Espanha, traz um interessante artigo sobre algumas dessas tecnologias de ponta que deverão ser utilizadas na horticultura mundial no decorrer da segunda década do século 21. Para o autor da matéria, Dr. Manuel Madrid, da empresa de consultoria técnica Morpho Systems SL, é uma realidade que a horticultura do futuro terá de produzir mais com menos, uma vez que disporá de menos água, menos terra, menos fertilizantes, menos plásticos derivados de petróleo, menos disponibilidade de agroquímicos, além de menos mão-de-obra. Ao mesmo tempo, a demanda por alimento crescerá com o aumento populacional, sobretudo na Ásia. De outro lado, a demanda do mercado consumidor por qualidade mostra tendência de crescimento em razão da exigência cada vez maior dos consumidores por produtos seguros, de melhor sabor e aroma, melhor aspecto externo e com vida útil pós-colheita estendida. Ainda, na opinião do autor, as perspectivas de desenvolvimento futuro da horticultura mundial deverão contribuir para alavancar seis áreas tecnológicas que, por seu potencial de crescimento, constituem grandes oportunidades de investimento para empreendedores do setor hortícola. Merecem destaque as seguintes áreas tecnológicas:
a) Controle biológico. O mercado de controle biológico por meio de inimigos naturais está crescendo à taxa acima de 10 % ao ano. Isso vem ocorrendo devido à pressão da sociedade pela redução do uso de agrotóxicos. É fato que os consumidores se preocupam cada vez mais com a segurança dos produtos hortifrutícolas que põem em sua mesa. Em vista disso, os supermercados estão exigindo, de seus fornecedores, frutas e hortaliças com nível de contaminação química e biológica zero;
b) Gestão da água de irrigação. A automação da irrigação e o uso de biosensores para otimizar a irrigação constituem dois aspectos dessa área tecnológica que tem como finalidade determinar, com exatidão, quanto os cultivos necessitam de água, evitando desperdícios. De outra parte, os sistemas e instalações de engenharia sanitária permitirão o aproveitamento, de maneira segura, de águas residuais regeneradas ou depuradas para vários usos, inclusive para a irrigação de cultivos hortícolas;
c) Horticultura de precisão. Trata-se de uma estratégia de gerenciamento que se utiliza da tecnologia da informação que permite a coleta de dados de múltiplas fontes com destaque para aquelas fornecidas pelos sistemas de geo-posicionamento por satélite (GPS) e de informação geográfica (GIS). Tais informações permitem otimizar a aplicação de corretivos e fertilizantes de acordo com as características do solo, o controle preciso da aplicação de defensivos agrícolas e as operações de plantio. As vantagens das aplicações dos princípios de horticultura de precisão estão relacionadas ao aumento da produtividade, economia de insumos agrícolas e sustentabilidade das áreas de cultivo em longo prazo;
d) Modelos de alerta para predição de controle de doenças. Estações metereológicas conectadas por telefone celular, com transmissão de dados climáticos online e armadilhas de esporos indicam os níveis de inóculo do patógeno e as condições favoráveis para a infecção. As amostragens de infecção precoce no campo indicam qual será a evolução da doença nos dias subsequentes. Com isso, poderão ser reduzidas consideravelmente as aplicações de fungicidas em campo, com economia de custos e redução de resíduos químicos;
e) Ajudas mecânicas para colheita. Há mais de 20 anos se tenta, sem muito êxito, construir robôs para realizar operações de campo, como a colheita de frutos, visando substituir mão-de-obra. No entanto, o desenvolvimento de equipamentos de ajuda mecânica à colheita, sobretudo na fruticultura, é apontado como uma alternativa mais simples tecnicamente e factível de ser adotada pelo setor produtivo do que robôs. As ajudas mecânicas efetivamente contribuirão para acelerar o trabalho do pessoal de campo bem como reduzir a necessidade de mão-de-obra;
f) Bioplásticos biodegradáveis no campo. O uso de plásticos derivados do petróleo na agricultura tem permitido a produção antecipada de cultivos em áreas de clima temperado. No entanto, no final da colheita, restam os resíduos no campo sem possibilidade de reciclagem. Na atualidade, estão sendo desenvolvidos plásticos baseados em PLA (ácido polilácto) e/ou outros polímeros derivados de restos agrícolas ou microorganismos com potencial de substituir os plásticos agrícolas. Posto que são de origem natural, tais plásticos não consomem petróleo e, por serem biodegradáveis, não precisam ser recolhidos uma vez que podem ser incorporados no solo como matéria orgânica.
Essas tecnologias prometem a reinvenção da horticultura dos países desenvolvidos. É provável que, em vista do estágio de desenvolvimento atual do setor hortícola brasileiro, a maioria dessas tecnologias não passe de mera curiosidade. Entretanto, à medida que o país busca se inserir como um player global no valioso mercado internacional de hortaliças, frutas, flores e plantas ornamentais, é recomendável que o setor empresarial esteja atento a esses avanços tecnológicos com potencial de impulsionar a produtividade e ajudar a vencer mais esse desafio.
*Paulo César Tavares de Melo é Presidente da ABH
Fonte: Revista Cultivar HF, junho-julho 2010, Ano IX, Nº 62, p.39.