Empreendedorismo na agricultura

Um dos nichos em ascensão no Brasil, o mercado de produtos orgânicos, ainda não tem contabilizado o volume produzido nem muito menos o faturamento. Por isso, a partir do próximo ano, o governo federal pretende fazer um levantamento completo de quem atua nesse setor.

Alex RégisHortas sem agrotóxico já é uma realidade entre muitos produtores do Rio Grande do Norte. A saúde do consumidor agradece
Hortas sem agrotóxico já é uma realidade entre muitos produtores do Rio Grande do Norte. A saúde do consumidor agradece

No Rio Grande do Norte, o cultivo de gêneros sem agrotóxicos é feito por pequenos empresários, gente com visão empreendedora que soube aliar bons negócios à demanda de consumo.

A produção de hortaliças e verduras agroecológicas já é uma realidade no Estado capaz de promover uma revolução econômica, pelo menos para os envolvidos com a atividade. Os orgânicos chegaram também à aqüicultura potiguar, com a criação de ostras e camarão ecologicamente correta.

Quando o bancário Marco Senas deixou o emprego no Banco do Brasil, há dez anos, pensou em montar um negócio que muitos, na época, jamais arriscariam. Adquiriu uma propriedade com oito hectares em Nísia Floresta (distante cerca de 35 quilômetros de Natal) e começou a cultivar hortaliças. Mas, o estalo veio após assistir a uma palestra, intitulada “Como tornar seu sítio produtivo’. A partir daí, ele teve a

idéia de não utilizar defensivos ou adubos químicos na lavoura.

Assim surgiu a Horta Viva, uma das poucas empresas do Rio Grande do Norte fornecedora de frutas, legumes e hortaliças orgânicos. Toda a produção é distribuída semanalmente às principais redes de supermercados da capital, como Nordestão e Favorito.

No início, Marco Senas reuniu outros pequenos agricultores e formou a Associação Potiguar de Produtores Orgânicos, que facilitava a comercialização do produto. O salto, no entanto, ocorreu em 2002 com a certificação do cultivo. Foi nesse momento em que o engenheiro agrônomo Leonardo Lorenzon, 37 anos, viu que ali poderia surgir um negócio lucrativo e tornou-se sócio de Marco Senas. “Foi uma questão de visão e de gosto pela atividade. Percebi que, na época, poderíamos produtos diferenciados e entrei como sócio da empresa”, disse Leonardo Lorenzon.

A demanda exigiu uma expansão. A empresa deu tão certo que, atualmente, a Horta Viva tem propriedades em Nísia Flroes, Parnamirim e Jandaíra, esta última é a maior delas com mais de 20 hectares cultivados. “Nossa meta é investir mais em tecnologia para termos uma produção constante o ano todo. Por isso, diversificamos as áreas de cultivo”, explicou Leonardo Lorenzon ao ressaltar que já compra orgânicos de produtores de Baia Formosa.

A Horta Viva produz hortaliças folhosas (couve, rúcula e alface), quiabo, berinjela, pepino e frutas da época (abacate, caju, banana, manga, mamão, melão e melancia) sem nenhum agrotóxico e com o selo de garantia do Instituto de Biodinâmica de Botucatu, o órgão certificador da empresa. 

Graças ao selo foi possível inserir os produtos nas gôndolas do antigo supermercado Sirva-se. Depois, foi a vez do Nordestão e Carrefour. Leonardo conta que a chegada do Hipermercado Extra em Natal contribuiu para expansão, já que a rede local ampliou a compra e ofereceu maior espaço nos estabelecimentos para os produtos orgânicos.  Com pouco mais de 20 funcionários, a Horta Viva tem um faturamento médio mensal de R4 40 mil.

Agroecológicas

 Para incentivar a produção de orgânicos no Estado, o Sebrae organiza feiras agroecológicas. Em Natal, a feira ocorre na praça de Mirassol e na praça cívica da UFRN, às manhãs de sábado, reunindo diversos pequenos produtores, que, como realizam a venda direta ao consumidor, estão desobrigados de selo de certificação. O órgão também estimula o cultivo desse tipo de alimento, através do programa Produção Agroecológica Integrada e Sustentável (PAIS). O projeto visa incentivar ações empreendedoras nessa área entre agricultores familiares, que têm parte da produção comprada por empresas como a Horta Viva.

No Rio Grande do Norte, são 300 unidades distribuídas entre a Grande Natal, região do Mato Grande, Vale do Açu e Mossoró, onde está em fase de implantação. Isso equivale a quase mil potiguares envolvidos na plantação de hortaliças orgânicas. Até o fim de 2010, o Sebrae espera instalar mais 200 unidades.

Tudo é feito com suporte agrônomo e se configura numa importante iniciativa por melhorar a qualidade da alimentação das famílias e, com a comercialização, gerar renda. O conselho da gestora do programa, Homerina Eugênia de Medeiros, para quem deseja apostar nesse ramo é buscar capacitação. “É uma área em franca expansão, mas é preciso muito conhecimento técnico”.


RN já tem camarão e ostra orgânicos

Já está comprovado que as empresas que mais se destacam são aquelas que dão novos usos para seu capital financeiro e intelectual, movimentando a economia da inovação.

Foi assim com a Primar, uma empresa de carcinicultura instalada em Tibau do Sul. Fundada em 1993, a companhia foi convertida para a área de aqüicultura orgânica nove anos depois da abertura devido à visão estratégica do empresário Alexandre Alter Wainberg, 49 anos.

“Estava difícil manter o discurso ambiental e continuar praticando a carcinicultura convencional que polui os recursos hídricos e degrada a própria fazenda resultando em doenças. Em 2002, tive problemas com a exportação de camarão e resolvi juntar o discurso à prática. Estudamos os riscos do setor e resolvi sair do esquema convencional e iniciar a produção no sistema orgânico. A certificação com o Instituto Biodinâmico foi alcançada em maio de 2003”, revelou.

A produção é feita sem ração, fertilizantes, produtos químicos, hormônios, conservantes,etc.

“Só colocamos sementes, água e amor. O resultado é a significativa melhora no crescimento e sobrevivência dos animais, além de passarem ilesos pelas doenças que atingem o setor”, acentua.

Ele investiu tudo no projeto, principalmente a dedicação e tempo. Não foi necessário fazer nenhuma mudança física na fazenda, de 42,4 hectares.

Todas as mudanças foram relacionadas ao manejo da produção. A certificação foi um processo caro e demorado, mas resultou em melhoria nos controles internos e em mais segurança para o consumidor.

Mas, engana-se quem pensa que houve crescimento de produção. Pelo contrário. O diferencial foi trocar quantidade por qualidade. “No último ano como carcinicultor, produzi 220 toneladas de camarão. Hoje, só produzo cerca de 45 toneladas de camarão orgânico e 60 toneladas de ostras orgânicas”. Porém, os produtos são bem aceitos e a produção é completamente absorvida por 35 estabelecimentos comerciais de Natal e Tibau do Sul. Neste mês, a Primar passa a comercializar ostras orgânicas também em Recife (PE).

“Estamos pesquisando a introdução de algas, peixes marinhos e ornamentais, siris moles, muitas outras espécies para complementar o sistema”, adiantou Alexandre Wainberg.


Mulheres entram no cultivo


Já bem o sol lança seus primeiros raios no horizonte e Marluce Trajano, de 52 anos, já está em pé para inspecionar a horta. Ela é uma das 60 mulheres do assentamento Caracaxá que participam do PAIS em Macaíba.

Com ajuda técnica do Sebrae e apoio da prefeitura local, elas produzem hortaliças orgânicas e vendem na feira agroecológica da cidade, às sextas-feiras.

É com o dinheiro gerado que Marluce Trajano mantém o lar e ainda possui uma ocupação depois que o cultivo do caju começou a decrescer.
“Foi ótimo porque, além de não gastar comprando essas verduras, temos dinheiro toda semana. Clientes vêm de natal só para comprar e esse contato é muito bacana”, disse.

Pode não parecer, mas, a inclusão do assentamento no programa é uma ação empreendedora. Graças a visão de futuro de uma mulher, Fátima Martins, que é uma espécie de líder das moradoras do assentamento, o Caracaxá atualmente tem sustentabilidade.
Em 2006, ela tomou conhecimento do programa e solicitou ajuda do Sebrae para implantação na comunidade.

Os consultores encontraram na área as condições favoráveis e hoje dezenas de famílias obtêm renda com a venda de couve, hortelã, beterraba, rabanete, tomate, pimentão e outros legumes, cultivados artesanalmente sem aditivos químicos.

Até o formato da roça ajuda a quebrar paradigmas. É circular. No centro, há espaço para criação de galinhas.

A estrutura é cercada pelo plantio de culturas variadas, que diversificam a produção. Parte dela vai parar na merenda escolar da rede municipal devido ao programa Compra Direta. Os resultados são promissores.

Fonte: Tribuna do Norte