“A fome não é um dado estatístico. Ela dói, degrada a pessoa e mata”, alertou Helder Muteia, representante da FAO (Organização das Nações Unidas Para Agricultura e Alimentação), na abertura do Fórum Inovação Agricultura e Alimentos Para o Futuro Sustentável, realizado na semana passada em São Paulo. O Fórum foi promovido pela FAO, ABAG (Associação Brasileira do Agronegócio) e ANDEF (Associação Nacional de Defesa Vegetal) dentro da Semana da Alimentação, celebrada no período de 11 a 16 deste mês, em mais de 180 países.
Dados da FAO indicam que o número de pessoas subnutridas no mundo teve a primeira queda em 15 anos em 2009, de 1,023 bilhão para 925 milhões. Mas embora tenha havido uma redução de 98 milhões de pessoas (9,6%) no total de subnutridos, o número continua alto, acima do objetivo estabelecido pelas metas do milênio, que era de reduzir pela metade o número de vítimas da fome no mundo até 2015.
Segundo Helder Muteia, o Brasil desenvolveu uma tecnologia tropical que transformou os cerrados em um dos maiores polos de produção agrícola do mundo. “Muitas dessas técnicas podem ser utilizadas nas savanas africanas, que têm condições de clima e de solo semelhantes”, disse o representante da FAO.
Mas o combate à fome exige muito mais do que tecnologia, alertou o representante da FAO. “Para erradicar a fome, temos que combater primeiro a pobreza no campo. Esta é a maior causa da insegurança alimentar”, alertou o moçambicano, acrescentando que a proposta da FAO é facilitar o acesso dos pequenos agricultores aos recursos naturais, à tecnologia, ao crédito e principalmente aos mercados.
“Os agricultores não estão no campo por questões morais. Eles querem ganhar dinheiro, vendendo suas safras a preços justos. O combate à pobreza no campo é o principal caminho para a erradicação da fome e requer um programa de financiamento para compra de insumos e maquinários, além de seguro agrícola, tecnologia e outras precondições para uma agricultura competitiva”, destacou Muteia. Para a FAO, o Brasil hoje é um grande laboratório para o mundo devido à dinâmica e à diversidade do seu agronegócio. “Além da tecnologia, as políticas de inclusão social desenvolvidas por aqui podem ser replicadas em outras partes do mundo”, explicou Muteia.
“O grande desafio da agricultura mundial será aumentar em 70% a produção de alimentos para atender uma população estimada em 9 bilhões de habitantes em 2050”, destacou João Sereno Lammel, presidente do Conselho Diretor da ANDEF e diretor da ABAG. Antonio Roque Dechen, diretor da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq), da Universidade de São Paulo, lembrou que o Brasil está vivendo sua terceira revolução verde — a expansão do plantio direto –, técnica que permite aumentar a produção com sustentabilidade.
“O Brasil é um dos poucos países entre as grandes potências agrícolas do Planeta cuja competitividade é capaz de responder o desafio de prover a crescente demanda de alimentos, fibras e energia sem prejuízo aos recursos naturais”, disse Eduardo Daher, diretor executivo da ANDEF. Daher citou o exemplo do “Farming First”, coalizão de produtores rurais, agrônomos, cientistas, entidades e indústrias de todo o mundo que está partilhando conhecimentos com pequenos agricultores da África. O Farming First propõe seis pilares na guerra contra a fome: preservação de recursos naturais, educação e extensão rural, acesso ao crédito e insumos modernos, proteção das culturas, acesso ao mercado e prioridade à pesquisa.
Neusa Maria Brunoro Costa, nutricionista e professora da Universidade Federal de Viçosa, destacou no Fórum o papel da biotecnologia para o combate à desnutrição. “Já estão sendo desenvolvidos alimentos biofortificados, como o arroz rico em ferro e o milho com zinco e vitamina A”, informou. O novo perfil do consumidor foi o tema de Jean Louis Gallego, diretor de marketing da FSB Foods. Ele apresentou no Fórum Inovação algumas tendências do mercado de alimentos para os próximos anos. “No Brasil, o aumento do emprego e da renda da população acelerou o consumo de alimentos”, lembrou Gallego.
Segundo ele, as necessidades dos consumidores também mudaram – em 1970, 88% da população faziam suas refeições em casa, percentagem que caiu para 71% hoje. O tempo médio de preparo das refeições, que em 1970 era de duas horas, caiu para apenas 15 minutos. “Com quase 30% da população fazendo suas refeições fora do lar, o “food service” registrou um crescimento espantoso de 532% de 1970 para cá. As tendências apontam para alimentos de conveniência, refeições rápidas, micro-ondas, embalagens biodegradáveis e porções individuais”, acrescentou Gallego. Nos próximos anos, segundo ele, o grande desafio da agricultura e das empresas de alimentação no Brasil será o de atender as necessidades de consumo de uma população que está cada vez mais velha.
Fonte: Grupo Cultivar